Qual é o seu sotaque? – Nosso Idioma
Seria redundante dizer que o Brasil é um país diverso. Vemos isso na sua arte, na sua música, na sua gastronomia, nas suas pessoas. E por isso mesmo que seria também ingenuidade afirmar que o português brasileiro apresenta uma unidade linguística.
As variações de produção (fala e escrita) e de recepção (leitura e escuta) aparecem em diferentes contextos de uso do português; mas é talvez em dois campos específicos que essa diversidade se mostre mais evidente: no campo da fonética e no campo do léxico. Nesse texto, vamos então nos ater aos nossos fonemas particulares e aos nossos acentos – ou como diríamos, ao nosso “sotaque”.
O sotaque é a maneira como pronunciamos distintamente algumas palavras, variando assim de região para região ao longo desse Brasil enorme. E, às vezes, não precisamos ir muito longe para distinguir um sotaque do outro. Variações na pronúncia do “r” no meio das palavras (como “porta”), sons vocálicos mais abertos ou mais fechados (como o “a” em “caminho”), inclusão de fonemas inexistentes (como “ein” em “cinquenta”) são alguns exemplos da diversidade fonética do português brasileiro. Pouco a pouco, vamos desenhando assim as características da fala de regiões distintas.
Caro professor, imagine a seguinte situação: você tem um aluno australiano, casado com uma paraibana. Na primeira aula, destinada à explicação de como os encontros vão funcionar, acontece o seguinte diálogo:
– De que parte do Brasil você é?
– Eu sou do Rio Grande do Sul.
– Hum, ok. Mas eu quero aprender a pronúncia da Paraíba.
O que o professor faz numa hora dessas? Joga limpo.
Não force a barra. Pra nenhum dos lados. Não diga ok, pois isso não faz parte da sua natureza, você não vai atuar. Mas também não diga que a pronúncia paraibana não é a correta (pois isso denotaria preconceito e muita ingenuidade da sua parte como professor de línguas) ou que não é referencial – pois é a referência do seu aluno: ele quer suas aulas para justamente se comunicar com a família da sua esposa, que é da Paraíba.
Mostre a ele onde as diferenças aparecem e procure, sempre que possível, trazer-lhe material fonético: entrevistas, músicas, exposições orais. E viva a tecnologia, que nos oferece uma bela gama de áudios e vídeos.
Apesar de todas essas diferenças, aprender e ensinar os sons do português brasileiro não é um bicho de sete cabeças, pois, mesmo que a ideia de unidade linguística seja ilusória, os livros didáticos nos trazem bons pontos de partida que servem de base para o estudante se instrumentalizar. Se ele é tcheco e aprendeu português na Bahia, certamente vai ser entendido em uma viagem por Minas Gerais. Porque também, ao fim e ao cabo, em geral o brasileiro tende a ser tolerante e cooperativo ao ver o estrangeiro falar sua língua.
* Tatiana Matzenbacher é diretora executiva do Falando Brasileiro (www.falandobrasileiro.com.br). Formada em Letras/Português, mestre em Literatura Brasileira Contemporânea, trabalha com ensino de Português para Estrangeiros há oito anos. Já foi professora na Universidade de New South Wales e Coordenadora Pedagógica na PLS, ambas na Austrália. Agora se prepara para assumir um cargo de professor-leitor na Sorbonne Nouvelle, em Paris.